Factos Urgentes a Saber Sobre...

Cancro do Pulmão

Porquê falar de Cancro do Pulmão (CP)?

A abordagem deste tema é uma consequência da demanda imperiosa de aumentar o conhecimento global sobre este tumor dado ser a primeira causa de morte por doença oncológica a nível mundial, e Portugal não é excepção, sendo emergente reverter esta realidade. A ideia prevalente é que se trata de um infortúnio dos fumadores, que representam 16,8% da população residente em Portugal continental com 15 ou mais anos, pois é universalmente reconhecido que o tabaco é seu principal factor de risco. Assim, a maioria da sociedade não vê este tumor como um problema seu e, por seu lado, grande parte dos fumadores finge ignorar a existência do CP, particularmente por barreiras emocionais que reflectem o receio deste diagnóstico e tudo o que implica. Posto isto, é importante clarificar alguns aspectos nomeadamente sobre a necessidade e possibilidade de identificação precoce desta doença, o que implicará melhor prognóstico, e alertar para a sua actual mudança epidemiológica dado que também poder ser uma doença dos não fumadores.

O que se torna urgente dar a conhecer sobre esta doença para que todos possamos estar mais atentos?

1.É a segunda doença oncológica mais frequente e a principal causa de morte por tumor maligno, implicando elevadas cargas de morbilidade, mortalidade e custos. 

2.Em Portugal, em 2020, foram diagnosticados 5415 novos casos, sendo o 4º tumor mais frequentemente diagnosticado em ambos os sexos (o 2º se forem excluídas as neoplasias da mama e da próstata).

3.É predominante entre os 70 e os 74 anos com superioridade nos homens acima dos 50 anos; todavia, abaixo dos 40 anos, a incidência é semelhante em ambos os sexos e globalmente tem aumentado de forma relativa nas mulheres.

4.A taxa de mortalidade do CP é maior no sexo masculino mas apresentando uma evolução positiva com menor número de óbitos contrariamente às mulheres onde verifica um maior número absoluto de mortes.

5.A maior parte dos doentes tem doença localmente avançada ou metastática ao diagnóstico (cerca de 75%), o que espelha a baixas taxas de sobrevivência relativa aos 5 anos (aproximadamente 6%). Quando diagnosticado em fases mais precoces, enquanto doença localizada, a sobrevivência é superior (sensivelmente 60% aos 5 anos). Por conseguinte constata-se que a extensão da doença ao diagnóstico (estadiamento) é um fator de prognóstico muito relevante pois traduzir-se-á nas estratégias terapêuticas a aplicar, com intenção curativa ou não.

Mas, como se justifica este fenómeno de diagnóstico tardio que evidencia um grande potencial para a implementação de estratégias de reconhecimento e diagnóstico precoces com o objectivo de reduzir esta elevada taxa de mortalidade?

1.A maioria dos sintomas é inespecífica (ou até inexistente) podendo facilmente sugerir outras doenças respiratórias crónicas, nomeadamente Doença Pulmonar Obstrutiva Crónica (DPOC) até pelo contexto epidemiológico comum do tabagismo.

2.À exceção das hemoptises (sangue expelido pela tosse), sinal mais alarmante que ocorre em apenas 5% dos doentes, os sintomas relatados como mudanças significativas no estado de saúde não são geralmente interpretados como graves, pelo que não desencadeiam rapidamente a procura dos serviços de saúde.

3.O não reconhecimento/valorização das queixas é a causa mais comum de atraso no contacto do doente com os cuidados primários de saúde (CPS) representando cerca de 60% da demora total no início do tratamento do CP. Particularmente, nos fumadores, se sintomáticos, o receio deste diagnóstico pode protelar/evitar a vigilância activa da sua saúde respiratória e/ou a procura de cuidados de saúde.

4.Por outro lado, também são identificadas fragilidades do lado dos profissionais de saúde como o não reconhecimento rápido dos sintomas enquanto indicativos de CP, pela frequente presença de outras doenças respiratórias nomeadamente nos fumadores, e as poucas linhas de orientação que existem sobre a valorização a dar às queixas apresentadas. É conhecido, noutros países, que, em média, cerca de 30% dos doentes tem três ou mais consultas nos CPS antes de ser referenciado a um especialista. Tal conduz a múltiplas investigações clínicas pouco orientadas, e assiste-se a um excesso de confiança na radiografia do tórax e à ausência de seguimento da evolução desta quando existem alterações. Também a referenciação inicial a um ?especialista não torácico? pode ser um motivo de demora. No âmbito de cuidados mais diferenciados, a necessidade de vários procedimentos invasivos para estabelecer o diagnóstico, a definição da abordagem terapêutica mais adequada e o eventual compromisso da capacidade de tratamento podem condicionar atrasos.

Em conclusão, existe um grande potencial para a implementação de estratégias de reconhecimento e diagnóstico precoces do CP com o objectivo de reduzir esta elevada taxa de mortalidade. É de importância relevante a implementação de políticas e intervenções de saúde pública com vista à sensibilização sobre a existência do CP, quer dirigidas à população em geral, quer aos profissionais de saúde, nomeadamente da Medicina Geral e Familiar, para além da necessária implementação de registos oncológicos, programas de cessação tabágica e rastreio do CP em larga escala.

Susana Simões 

Notas identificativas

Pneumologista da Unidade de Pulmão da Fundação Champalimaud

Especialista em Cancro do Pulmão e Cessação Tabágica


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